“As cartas estão marcadas. As regras, manipuladas. Bem-vindos à morte da Idade da Razão.”

House of Cards chegou enfim em sua aguardada 5º temporada onde os eventos iniciados há cinco anos da jornada de Frank Underwood (Kevin Spacey) caminham para o seu clímax no ano em que pode ser considerado um dos melhores da série e, que com certeza a consolida como uma das melhores produções da Netflix de todos os tempos.

Na trama da série, Frank Underwood é um ambicioso congressista dos EUA que após ser traído pelo presidente que ajudou a ser eleito, ele inicia uma jornada rumo ao poder usando todos os meios necessários na política, tudo para alcançar e se manter no topo e para isso sempre conta com o auxílio de sua esposa e, parceira na politicagem, Claire Underwood (Robin Wright).

Dito isso, podemos falar sobre o roteiro da nova temporada. A equipe continua bem afiada em seus diálogos e assim como sempre mantiveram a história intricada onde diversas ramificações e subtramas não só coexistem, mas também caminham todas para um único lugar. É como se fossem pequenas engrenagens em vários pontos diferentes da grande máquina política da Casa Branca que parece ganhar tons cada vez mais sombrios a cada ano.

Pois começamos dando continuidade aos eventos da temporada anterior que tiveram suas resoluções adiadas, até aquele ponto duas narrativas estavam sendo traçadas nos últimos episódios do ano anterior. Os conflitos com o grupo terrorista OCI que chegam a níveis internacionais, com a participações dos governos da China e da Rússia e a eleição que decidirá o novo presidente dos EUA prosseguindo explorando bem as diferenças e a rivalidade entre Frank e Conway (Joel Kinnaman), fora um terceiro arco envolvendo a mídia jornalística e os eventos passados com Zoe Barnes (Kate Mara), repercutindo de forma cada vez mais vital nos outros dois arcos.

Essa é a temporada onde os elementos se intensificam a cada capítulo e tornam esse período narrado, um verdadeiro inferno para o povo americano. Assim como eles, nós nos sentimos cansados da complicação em que Frank Underwood coloca a todos, prolongando as situações por mais tempo do que deveriam, o protagonista tem de lidar com ameaças externas tanto de jornalistas, quanto de terroristas, ao mesmo tempo em que suas maquinações para alcançar poder entregam a todos um caos e desordem por onde passa, liberando aos poucos esse monstro guardado no interior dele. Enquanto nos chocamos com suas ações entre uma ocasião e outra, Claire Underwood mostra todas a sua força e cresce exponencialmente na história.

Esse também se mostra um ano de interligação entre eventos de anos anteriores, como o Impeachment do antigo presidente e, a morte de Zoe Barnes, que conseguem ganhar espaço no meio da confusão, adicionando mais variáveis assombrosas ao seriado, fazendo-nos não suspeitar e nem poder especular nada, pois por mais que Frank nos exponha seus pensamentos mais íntimos quebrando a “quarta parede”, ele ainda esconde muitos segredos, o que faz com que o final da temporada tenha ainda mais peso dramático para o seu público.

Além da crueza das manipulações e politicagens executadas e sofridas por todos, ainda existe um pequeno elemento que faz uma grande diferença dessa produção em relação à várias outras, trata-se do desenvolvimento de seus personagens, afinal aqui vemos um cuidado gigantesco com cada um deles, assim como já vinha ocorrendo desde a sua primeira temporada, como o crescimento de Claire, as perturbações de Doug Stamper (Michael Kelly) e logicamente seu protagonista cruel e frio, Frank Underwood, que com sua personalidade ambiciosa e dotada falta de consciência define a série e a torna tão incrivelmente carismática.

Mas é apenas em seu roteiro que estão as qualidades de House of Cards?

É certamente muito difícil falar dela sem comentarmos sobre o visual cru e denso que a série possui, sendo uma grande contribuição de sua direção de fotografia que, é também um dos pontos mais altos da produção, sendo capaz de enriquecer a jornada de Frank nos mínimos detalhes, seja com suas cores frias que oscilam entre o amarelo e o azul ou nos enquadramentos que sempre sabem usar os planos fechados na hora de privilegiar as atuações ou em grandes planos gerais nos contextualizando com a natureza física. Em determinados momento a direção ainda se dá ao luxo de usar efeitos de zoom, aproximando e distanciando a câmera nos momentos certos para impactar quem estiver assistindo, a técnica da série é realmente muito bem pensada e estruturada.

Mas é preciso saber como compor tudo isso dentro da dinâmica das cenas e, é nessa parte que entra o brilhante elenco formado por nomes como: Kevin Spacey, Robin Wright, Paul Sparks, Neve Campbell, Michael Kelly, Boris McGiver, Patricia Clarkson, Joel Kinnaman, entre outros.

O casting da série sempre trabalhou muito bem dando carisma e realismo para cada um desses personagens e todos foram bem desenvolvido ao longo dos anos, além disso, nas últimas temporadas, Paul Sparks como Thomas Yates e Joel Kinnaman como Will Conway haviam ganho grande destaque e não é por menos, pois algumas das melhores cenas estão nas interações entre Conway e Frank, determinados, contrastantes e habilidosos no governo, ambos formam uma rivalidade extremamente divertida de ser assistida, capítulo após capítulo.

Mas o quinto ano ainda trás grandes surpresas, tanto na presença de Boris McGiver como Tom Hammerschmidt quanto em Patricia Clarkson com a sua Jane Davis, movimentando e gerando reviravoltas inesperadas com suas performances marcantes, entretanto, mais uma vez as melhores atuações estão com o trio formado por Spacey como Frank Underwood, Wright como Claire Underwood e Kelly como Doug Stamper, mesmo que todo o resto decepcionasse, eles ainda conseguiriam segurar a série apenas com seus personagens.

Frank está intenso, carismático, monstruoso, engraçado e até um tanto depravado na interpretação que deve ser a melhor da carreira do ator até hoje. Claire é emocionante, empática, independente, ardilosa e sua força as vezes até supera a de seu marido. Já Doug demonstra muito sem dizer nada, com uma performance contida sentimos sua dor, remorso, crença e um certo desespero gritando em seus olhares e postura, mas nem por isso deixa de aterrorizar a todos, provando sua lealdade aos Underwood.

Mas mesmo com tudo isso, precisaria pensar na arte?

Talvez não, mas a escolha do diretor de arte é trazer à tona o realismo mais forte possível dentro da série, buscando manter o impacto da crueza das histórias. Todos os objetos e design dos cenários são muito fiéis aos do Congresso americano, fora isso também se especializam em transmitir um pouco do espírito de cada personagem em suas casas, esse tipo de uso da arte também se aplica a seus figurinos que estão de acordo com suas respectivas personalidades.

Agora um dos pontos mais fortes dessa produção que, como podem perceber são muitos, é a direção. Nem toda série possui uma mão pesada no direcionamento, mas esse não é o caso aqui. Cada pequeno detalhe é muito bem dirigido e estruturado ao longo da temporada, desde os momentos de Frank conversando com o púbico até as cenas intensas e pesadas que dependem da total falta de som ambiente e das atuações, tudo nesse ponto é perfeito.

House of Cards foi uma das primeiras apostas da Netflix e muito se criticou a princípio por ser um remake de uma série inglesa, no entanto, souberam usar o grande material da política americana e global, junto de um dos melhores personagens que já apareceram na cultura pop, e assim a série seguiu crescendo e se tornando cada vez mais empolgante e complexa, esperamos que continuem assim, afinal a história parece que só está começando a esquentar.

REVER GERAL
Roteiro
9
Direção
10
Atuações
10
Direção de Fotografia
10
Direção de Arte
9
Nascido em São Joaquim da Barra interior de São Paulo, sou um escritor, cineasta e autor na Cine Mundo, um cinéfilo fã de Spielberg e Guillermo del Toro, viciado em séries, leitor de quadrinhos/mangás e entusiasta de animações.