Me arrisco a dizer que existe dois tipos de cinéfilos: os que declaram que o cinema nacional não presta, e os que assistiram “A Máquina”. Até consigo compreender o fato de alguém ter testemunhado essa obra e não se apaixonado como eu me apaixonei, porém é inadmissível o não reconhecimento de algo tão bonito, falado em português.
“A Máquina” foi dirigido por João Falcão e baseado na obra literária de Adriana Falcão. Conta a história de Antônio e Karina, o moço que está satisfeito em passar a vida inteira na cidade Nordestina, e a moça que acha aquilo tudo pouco demais e quer conhecer o mundo, ser uma atriz famosa. Antônio é um senhor do tempo, e ele promete ao Brasil inteiro que irá fazer uma viagem no tempo a fim de provar seu amor por Karina.
De imediato já me vi encantada por essa obra, a direção de arte brinca lindamente com a composição das cores, o cenário e em alguns momentos do diálogo o filme parece teatro, a cidade de Nordestina me lembrou muito a cidade de “Dogville” do prefeito Lars Von Trier, só que sendo um pouquinho mais feliz. Parece que nada mais existe, não tem por onde entrar nem por onde sair, o mundo começa e termina na cidade de Nordestina.
A interpretações são tão bonitas e delicadas que, apesar do regionalismo já conhecido nos nossos filmes sobre o sertão Ao passo que escrevo esse texto imagino o sotaque reproduzido por Karina e Antônio.
Logo após vermos Antônio declarando seu amor por Nordestina, somos apresentados à Karina, cantando e andando de bicicleta, ela maior que a cidade, numa metáfora visual colorida esplendorosa; aos sonhos de Karina, sair daquela pobre cidade e ir conhecer o mundo, pois ela é grande demais pra ficar ali.
Outro, e talvez o principal charme dessa obra, é o roteiro. É um texto brasileiro para brasileiros, muito da poesia se perderia em qualquer tradução, por vezes tive a impressão de que estava assistindo um recital de cordel, as falas e diálogos são muito bem trabalhadas, as palavras são meros brinquedos nesse roteiro, e o resultado da brincadeira é delicado e lindo. Ressaltando um humor simples, produzido basicamente no diálogo, atribuído ainda mais leveda à narrativa.
“- Como é que essa cidade pode ir pra frente se o povo só faz é deixar ela pra trás?
– Pai, o povo vai embora porque aqui não tem recurso.
– Oxe, e por que não não manda os recursos pra cá?
– Mandar recurso pra cá pra que se o povo tá todo indo embora?
– O povo fica aqui.
– Mas se aqui não tem recurso!”
“A Máquina” se tornou um meus filmes favoritos, pelas excelentes atuações de todo o elenco, pela arte do filme, pela edição e ousadia de fazer um filme tão maduro e diferente com dois temas que o cinema nacional já enxugou: Sertão e amor. O roteiro é uma grande poesia, casando perfeitamente com o visual colorido, feliz e teatral da cidadezinha de Nordestina, acredito que qualquer pessoa que vem de uma cidade pequena, irá se identificar com as situações e os sonhos dessas pessoas, e, como eu, pode terminar o filme suspirando.