Desde o lançamento do livro de Deuses Americanos houveram diversos projetos até hoje tentando levar uma adaptação da obra adiante, tanto em séries como em filmes chegando até mesmo a ter um projeto pela HBO, no entanto nunca conseguiam atender às exigências do material, afinal estamos falando aqui de um livro complexo e extremamente inventivo. Eis que para nossa surpresa tivemos uma ótima produção com a união do canal Starz com o produtor Bryan Fuller que antes havia feito a série “Hannibal”, aqui ambos entregam um trabalho exemplar.
Na história um ex-condenado, Shadow (Ricky Whittle), viaja pelas estradas dos EUA nos dias atuais repleta de deuses mitológicos da antiguidade, enquanto isso ele presta serviços para o pilantra Wednesday (Ian McShane) e se preparam para uma forte tempestade que surgirá com o confronto dos Deuses Antigos e dos Novos.
O roteiro é intenso, divertido, original e misterioso ao adaptar com muita calma as diversas camadas do livro com fidelidade extrema, mas sempre tendo consciência da transferência e sabendo trabalhar isso para até melhorar e agilizar os eventos da série.
O arco se define com subtramas que sugerem acontecimentos misteriosos no passado e no presente a respeito de deuses e criaturas fantásticas e com um foco principal no arco pessoal de Shadow Moon saindo da prisão e fazendo uma jornada para chegar ao funeral de sua esposa. Em seu caminho encontra-se Wednesday, um vigarista carismático e extravagante cheio de mistérios que oferece uma súbita proposta de trabalho para Moon, como se ele não tivesse já muito a lidar no episódio.
Como se pôde ver os personagens são apresentados enquanto aos poucos desvendamos os mistérios intrigantes desse universo místico que vão desde os tempos antigos até o dias modernos, e como se o script já não fosse tão incomum ainda há espaços para estranhos sonhos do protagonista que serão aprofundados no decorrer da série. Dizer qualquer coisa a mais seria estragar surpresas, só podemos comentar que é preciso estar atento a cada detalhe da trama.
O elenco tem ótimas performances de Ricky Whittle, Ian McShane, Pablo Schreiber entre vários outros, entretanto, McShane e Whittle são o grande destaque do episódio. Ian McShane personifica o excêntrico e malandro Sr. Wednesday que traz um tom cômico, imponente e misterioso para trama em paralelo com a atuação de Ricky Whittle que interpreta Shadow Moon, o protagonista e ex-vigarista que se apresenta como um homem curioso por suas visões e focado em ser uma boa pessoa para compensar os erros do passado.
Em menor escala vemos atuações marcadas por presenças fortes de Yetide Badaki como a intrigante Bilquis, Bruce Langley como o presunçoso Technical Boy e Pablo Schreiber como o estranho Mad Sweeney, além de Jonathan Tucker como o insano Low Key Lyesmith que com certeza é um dos que mais me divertiram depois de Wednesday, no entanto eles devem ter mais espaço para se aprofundarem no futuro e explorarem mais camadas dos personagens.
A direção de fotografia é um dos ápices aqui, pois através de cores e enquadramentos somos levados por uma verdadeira viagem psicodélica que monta cada cena como se fosse uma grande pintura recheada de cores, luzes e movimentos, um trabalho extremamente minucioso em harmonia com a narrativa e conteúdo da série.
A direção de Arte auxilia muito a linguagem de Gaiman e Fuller e traz um forte complemento a sua fotografia, sendo que isso se faz graças ao design e construção de cenários caóticos equilibrados como também por seus figurinos modernos e clássicos que ambientam e carregam seus personagens de personalidade.
E chegamos ao seu ponto alto, a direção, aqui nesse âmbito se conquista o inimaginável pois consegue trazer cada um dos elementos e direcionar atores, cores, cenários e diálogos da maneira mais fiel possível emulando todo o estilo e equilíbrio caótico da obra que sabia misturar humor negro, drama adulto, fantasia, ação e mistério e se depender do livro a série ainda poderá caminhar e ser bem sucedida por muitos outros gêneros.
“American Gods” é a adaptação que os fãs esperaram anos e anos, além de ser a produção que melhor conseguiu captar a essência da escrita de Neil Gaiman para outra mídia, soando estranho, místico e com um grande quebra-cabeça para seu público, o que poderá render um entretenimento muito original e ousado para o mercado atual, mas a importância desse projeto irá muito mais longe, afinal podemos dizer que estamos diante do que pode ser a substituta definitiva e perfeita de “Game of Thrones” como uma série de fantasia adulta original que surpreende e nos faz pedir por mais e mais episódios enquanto teorizamos sobre a trama. Vale lembrar que muita coisa nova pode surgir pois já foi dito que a série irá expandir o material do livro com novos acontecimentos e personagens.