Título: As Virgens Suicidas | The Virgin Suicides
Autora: Jeffrey Eugenides
Editora: Rocco (L&PM Pocket)
Ano: 2008
206 páginas
“As virgens suicidas” se passa no subúrbio americano por volta dos anos 70 e narra a história de cinco irmãs: Cecília de 13 anos, Lux de 14, Bonnie de 15, Mary de 16 e Therese de 17, irmãs que no curto período de um ano tiram a própria vida.
A história é contada por um grupo de garotos de seu bairro que anos depois das mortes ainda guardam lembranças dos episódios e tentam decifrar aqueles acontecimentos. Os pais das irmãs Lisbon – especialmente a mãe – eram muito rigorosos quanto à vida das filhas, tinham regras para absolutamente tudo.
Jeffrey Eugenides demonstra grande inteligência e sensibilidade ao entregar a narração da história aos vizinhos das Lisbon, temos acervo limitado de informações sobre elas aumentando ainda mais o ar enigmático nutrido por aquelas garotas, nunca sabemos como elas se sentem ou no que estão pensando, todas as informações que temos sobre a vida das meninas se dá através do olhar de outrem e, considerando que esse livro é sobre a repressão da sexualidade feminina, isso demonstra a dificuldade que os homens podem ter em compreender como e o que é ser mulher dentro de uma sociedade que diz que elas não podem expressar sua sexualidade da mesma forma que eles expressam. Eventualmente os garotos tem acesso ao diário de Cecília – a primeira Lisbon a se matar. A passagem que conta a reflexão que eles tiveram ao ler aquele diário é dolorosamente primorosa.
“Soubemos como dói o vento frio do inverno entrando por debaixo da saia, como é sofrido manter os joelhos juntos na sala de aula, e como é monótono e irritante ter que pular corda enquanto os meninos jogam beisebol. Nunca conseguimos entender porque as meninas faziam questão de ser maduras, nem porque sentiam tanta necessidade de elogiar umas às outras, mas às vezes, depois de um de nós ter lido em voz alta um trecho do diário, tínhamos que combater o desejo de nos abraçar ou de dizer uns aos outros como éramos bonitos. Sentimos o aprisionamento que é ser garota, e como isso torna a mente ativa e sonhadora, e como a gente acaba sabendo quais as cores que combinam entre si. Soubemos que as garotas são nossas gêmeas, que existíamos todos no mesmo espaço como animais de idêntica pele, e que elas sabiam tudo a nosso respeito embora nós não soubéssemos nada delas. Soubemos, afinal, que as garotas na realidade são mulheres disfarçadas que compreendem o amor e até mesmo a morte, e que a nossa tarefa era apenas gerar o barulho que parecia fasciná-las”.
A mãe das meninas é uma católica ortodoxa que prende suas filhas dentro da própria crença e tem na Virgem Maria um símbolo da perfeição. A escrita de Eugenides deixa muitas coisas nas entrelinhas, permitindo que cada leitor faça sua própria interpretação e tente explicar pra si o que levou aquelas meninas a tirarem suas vidas. A escrita é muito densa, os parágrafos e capítulos são enormes, o que pode tornar a leitura cansativa, diálogos são quase inexistentes, a impressão que dá é a de que estamos lendo uma longa carta, por vezes o autor termina um parágrafo com alguma frase carregada de subtexto quase forçando o leitor a parar e digerir.
“As Virgens Suicidas” é um livro diferenciado, é denso e mórbido ao passo que também divertido e cativante, é misterioso não só por nunca de fato realmente conhecermos as Lisbon e suas motivações, Jeffrey Eugenides não deixa claro qual o propósito da própria obra, é de fato uma história sobre a repressão sexual feminina decorrente de uma cultura machista influenciada pelos preceitos conservadores da religião? É uma obra sobre o suicídio na adolescência – algo muito comum entre os jovens americanos? É um livro sobre obcessão? Ou amor? Ou é sobre tudo isso? O fato é que lê-lo foi uma grande experiência que me fez pensar ainda mais sobre todos os aspectos supracitados, e o fato de nunca sabermos um mísero pensamento das Lisbon é um toque sutil que reforça a mensagem declarada por Cecília ao médico que a atende após sua primeira tentativa de suicídio. O médico diz: “O que é que você está fazendo aqui, meu bem? Você não tem sequer idade para saber como a vida fica ruim depois”. E Cecília responde:
“Evidentemente, doutor. O senhor nunca foi uma garota de 13 anos”.
Quem somos nós pra decidir se outro sofre ou não? Quem somos nós para chamarmos de fraco aquele que desiste de viver? “As Virgens Suicidas” é mais que um livro sobre qualquer coisa, é um convite ao desconhecido, um chamado ao entrar em contato com que não conhecemos ou não compreendemos, isso pode ser o sofrimento conhecido apenas pelas mulheres, ou a própria morte.